quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

Inquilino

O coração
É um imóvel
Engraçado.
Onde um dia coube
o incabível
não cabe mais
o inacabado.

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Verso Limpo

Queria um verso
Limpo
Pra não dizer o que sinto
Um verso feito pra roubar,
de tudo que olho,
Meu olhar.

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Pituba II

É qualquer rua
ENSOLARADA
De muitos ventos
POEIRA
E folhas secas
AMARELADAS
De amendoeira.

Pituba

Vento forte
Arranca
O sal do mar
E desgrenha
Os coqueiros
Do jardim de
Alá.

segunda-feira, 1 de outubro de 2007

A minha Ira

Não incomode minha ira
Ela dorme há muito tempo
E a qualquer momento
Ela pode despertar.

Na minha carne ela dorme.

Eu, sua criatura,
Agüento a tudo chorando baixo
Contando os passos
Bem devagar
Agüento a tudo
Por que ela dorme (esse ser verdadeiro)
O seu sono hibernal.

Eu sou o seu corpo
E vejam como estou magro,
Vejam minha cara de fome
Meus olhos fundos
Meu grito mudo ao crime impune.

E prestem atenção;

Minha ira promete,
quando acordar,
Naufragar todas as ilhas.

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

Manhã a seu lado

Dormindo
Esqueceu de ser
rija maquinaria do viver
E despertou o Sol
Bem abaixo do meu umbigo.

O corpo ao meu lado
Ensinava-me
A Ser
As muitas maneiras de querer
Alguém
Por sentidos que eu mesmo
desconheço.

sexta-feira, 31 de agosto de 2007

Medida

Computo minha dor
Meço minha alegria
Com a régua do amor
Que perdi um dia

É bem verdade que
na métrica da paixão
Mais vale o pulsar
Do meu coração

Do que qualquer medida
De varrer o mundo;
- Pois que vejo raso
Com o olhar profundo.

Silêncio

O que trago, hoje, de mais
Acabado e perfeito
É este silêncio vestindo
Cada pedra arremessada
Cada palavra cravada na carne, no sangue nosso
Que é o mesmo e, desfeito,
Estende-se em rio intransponível.

Nada tenho a te dizer
Do amor que colhi aos vinte e sete anos
Nem sobre qual quer outro assunto cotidiano;
Dos preços, da política, da chuva que cai a esta época do ano,
Nada além do medíocre, das dívidas,
Do pasto curto espaço da sobrevivência ordinária.
Nada

Apenas este silêncio crivado de
Palavras em riste,
Apontando nosso evidente fracasso.

Este silêncio triste, absurdo, que insiste em não se cumprir,
E que só poderia existir
Entre dois irmãos.

sexta-feira, 17 de agosto de 2007

Caminho II

Perdoem os versos
maltrapilhos
Com os quais ladrilho
minha estrada

- São faróis,
apenas isto,
No cume
o lume
da alvorada.

quarta-feira, 15 de agosto de 2007

Caminho

O poeta
trilha o caminho inverso
das palavras
para reencontrar,
no final da sua jornada
o mundo impronunciável
e uno.

segunda-feira, 16 de julho de 2007

Se eu for embora
Em tão tenra idade
Leve-me seus olhos
Úmidos de saudade.


Se não for o caso
De saudades sofrer
Leve-me o silêncio
No fundo de você


Se o silêncio não
calhar ao seu peito
Leve-me ao menos
Seu profundo respeito


Se respeito eu não
Mais lhe inspirar
Leve-me à cova
E capriche com a pá.

 

sexta-feira, 13 de julho de 2007

As palavras

Rebentam, rebanho, na
Superfície dorida
E a ferida à tinta nunca sara.

quinta-feira, 12 de julho de 2007

almermética

Indomável
estupidez
solta sobre
a superfície do
mundo

abato-me mudo antes de
alçar vôo.

toda palavra
em minha boca
é vã brincadeira,
nenhuma é capaz de
me compreender em palavra

nada traduz
a
miséria
do homem
esmagado
contra o peso
de ser
uma pedra.

quarta-feira, 11 de julho de 2007

Saudade II

A saudade é um Sol extinto
iluminando a noite insone
não brilha, não aquece
não consome no seu lume
outra espécie
que não o homem.

Saudade I

Tinta
que
reinventa
e pinta
luz
nova
na manhã
extinta.

terça-feira, 10 de julho de 2007

Gesto

Há algo de irrevogável no adeus.
Nos abraçamos, juramos qualquer coisa diante de um
Deus suspenso, vigilante até quando de costas.
É um fato, está nos retratos, no papel, mais do que no papel, no silêncio das bocas, antes generosas, na inércia de mãos agora mortas, uma sobreposta a outra.
Mãos mortas, delas nasceram outras - menos abertas ao afago do que ao adeus redivivo. Delas nasceram outras no gesto de dentro do carro,
não de qualquer carro, mas daquele que nunca parou de partir,
que não se cumpre,
que não retira seu movimento de dentro da terra,
mas do espaço não geográfico, deserto no olhar que ainda vê
A mão espalmada em um adeus tão certo.

Primeira

Aqui jaz escrita
por ora obra completa
Repleta do amplo vazio
Que tece toda matéria.

É torta,
A cara do escriba – dirão.
Mas a letra morta, abrandada,
Sobre esta lâmina branca
Já há muito tempo descansa
E não há mais o que se faça
Com o coração que trespassa
A ponta da minha esferográfica
lança.